terça-feira, 23 de outubro de 2012

ABERTURA DA EXPOSIÇÃO 130 ANOS DE MONTEIRO LOBATO - Biblioteca Municipal de Campos do Jordão


Falar de Monteiro Lobato se constitui, antes de mais nada, um grande desafio. Ainda mais agora, quando ele volta a ser atacado pela acusação de racismo em função do conto "Negrinha", que abre o livro homônimo. Mesma coisa havia ocorrido em 2010, quanto a 'As Caçadas de Pedrinho'. E eis que, pela segunda vez em aproximadamente sessenta dias, sou convidado a falar sobre o homenageado, desta vez  por ocasião da abertura da Exposição 130 Anos de Lobato, iniciativa da Biblioteca Municipal de Campos do Jordão, que se deu no último dia 15 de outubro.
Fico muito preocupado ao receber um convite deste naipe, sobretudo quando penso em pessoas como Israel Dias Novaes (in memorian), Luiz Ernesto Kawall, Niled Dias Toniolo e Marisa Lajolo, só para falar nos que me são mais próximos, física ou virtualmente falando, e que seriam estas pessoas que abrilhantariam muito mais o evento do que eu. Não é falsa modéstia. É fato. Punto.
Mas vamos lá.
Preparar-se para falar sobre a vida e a obra de Lobato significa, literalmente, mergulhar num oceano que o Google, por exemplo, não alcança -graças a Deus. É necessário ler suas obras, ouvir suas entrevistas (como a que tenho em meu acervo, a última dada por ele em vida ao jornalista Murilo Antunes, da Rádio Record, dois dias antes da morte do escritor, em sua casa paulistana, no ano de 1948, presente do já citado Kawall e que deixei em forma de empréstimo ao pessoal da Biblioteca até o final da Exposição), meditar sobre cada palavra contida em seus contos e artigos, admirar extasiado suas aquarelas e as fotografias que ele próprio tirou quando viveu em Campos do Jordão, na rua Macedo Soares. É necessário ouvir o Edmundo Ferreira da Rocha falar de sua luta pelo resgate deste material iconográfico e da importância dele para o resgate da memória desta Cidade já quase sem memória.



Se Lobato era racista? Pouco se me dá, como dizia Jânio. Confesso que não cheguei a conclusão nenhuma sobre este assunto, e nem pretendo. Considero legítimas as petições dos grupos que defendem os interesses dos afro-brasileiros, como também continuo achando que olhos persecutórios sobre a obra de quem quer que seja costumam produzir resultados dúbios. O próprio conto "Negrinha" mostra um Lobato denunciador das mazelas e do sofrimento dos escravos e seus filhos recém-libertados poucas décadas após a Abolição, e acusador da patroa branca, rica, europeia e católica -que se revela um verdadeiro monstro. A defesa dos cidadãos vítima da escravidão também fica clara nos contos "O Jardineiro Timóteo", "Quero Ajudar o Brasil" e o "Bugio Moqueado". Se querem acusá-lo de racismo, não vai ser através deste livro, e sim através de várias declarações dadas por ele, em entrevistas faladas e escritas onde, em meio a tantas polêmicas, ele dá mostras claras de sua inclinação à eugenia. Portanto, tudo indica que estão acusando o homem certo, pelo livro errado.
Não faço defesa nenhuma de Monteiro Lobato - até porque tratava-se, apesar de um homem extraordinário, de apenas um homem, com todos os vícios e virtudes de nossa condição. 
O que espero é que não esteja em curso uma espécie de "demonização" de sua figura histórica. Ao mesmo tempo, penso que alegar que ele apenas reproduzia o pensamento de sua época é simplificar demais a questão.
Que os acadêmicos, estudiosos e juízes do STF -que é onde o caso foi parar- decidam, portanto, a querela.
Por mim, continuarei admirando o homem e o escritor José Bento Monteiro Lobato, como uma figura que faz uma falta abissal nos conturbados dias de hoje desta Pindorama dada a escândalos e jogos de cena.
Como disse o próprio a Israel Dias Novaes, segundo conferência realizada por este último em nossa Academia de Letras de Campos do Jordão, em 1995, "usei cada tropeço que tive na vida como impulso para voltar a acelerar". Estivesse vivo hoje, diante de uma nova acusação, certamente estaria voltando a acelerar, o nosso José Bento.

        Nossa família reunida na Biblioteca, atenta a ouvir o Edmundo falar de Lobato em Campos do Jordão

Benilson Toniolo

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