Depois deste episódio magnífico do ‘Milagre de Santa
Luzia’, fico aqui pensando como será o céu dos artistas nordestinos. Mas os
genuínos, aqueles que honraram verdadeiramente o legado que receberam da terra
esturricada e do salitre dos mares esverdeados. Aqueles que foram fieis à sua
história e à sua incalculável cultura. Neste céu não entram, obrigatoriamente,
os cantores do Calypso nem do É o Tchan, além de outros do gênero. Mas entram os
‘meus’ nordestinos.
Imagino Dominguinhos, então, entrando nesse lugar que
Deus há de ter preparado para que se pudessem juntar, na eternidade que lhes é
devida, todos os seus pares, os que se foram há pouco, os que se foram há muito
tempo, os que não foram ainda. Porque Deus deve ter essa competência e essa
sensibilidade, de separar no paraíso um lugar privilegiado para essa gente que
nasceu sob o signo da arte e da luta desmantelada pela sobrevivência.
Dominguinhos deve ter chegado lá com a sanfona colada ao
peito, numa osmose que se desenvolveu desde a infância. Com seu imenso sorriso,
com sua voz baixa e grave, com sua cabeça chata, seu chapéu de bosta de rola,
suas alpercatas, seu andar desengonçado.
E lá deviam estar a lhe esperar o Velho Lua, o Sivuca, o
Patativa, e tantos outros. E lá no fundo seu velho pai, discreto, calado e
distante, do jeito mesmo que é o jeito dos nordestinos sertanejos, os homens
fortes e bravos do Nordeste brasileiro.
Assim como o seo Benício, do mesmo-jeito-mesminho, me há de
me receber um dia.