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Benilson Toniolo
Cheguei do horário do jantar, fechei a
porta da cabine e voltei ao trabalho de programação do sistema. Após alguns
minutos, alguém bateu à porta da sala, fui abrir e era o Gerente de plantão,
que trazia um radinho de pilha, vermelho, na mão.
- É você que é o Benilson? Então,
enquanto você estava fora seu pai passou por aqui e pediu para lhe entregar
este rádio. Ele disse que você queria ouvir o jogo desta noite e resolveu te
trazer o rádio.
Seo Benício nunca foi muito chegado a
futebol. Não dava importância. Naquela noite, voltava para casa de ônibus
depois de mais um dia de trabalho quando resolveu descer no meio do caminho
para me entregar um radinho de pilha para que eu pudesse ouvir o jogo.
Meu pai era um sertanejo macho, que entre
outras coisas dizia que não dava carinho aos filhos para que, quando ele
morresse, ninguém sentisse falta dele. Falácia. Era através de carinhos como
este que ele deixava sua marca com a gente. Quando eu era menino, lembro que
ele gostava de se deitar em sua cama depois da janta. Eu ia lá, me deitava sobre
seu peito e ficava brincando com seus pelos do tórax. Ele imitava um leão e
abria uma bocarra enorme, fingindo me morder e me fazendo cócegas. Também
brinquei assim com meus meninos. Pai é tudo igual –mesmo depois de sacolejar
por onze dias em cima de um pau-de-arara, fugindo da seca que incendiava o
sertão das Alagoas.
Quase não pude ouvir o jogo direito naquela
noite por conta da interferência que as máquinas produziam na transmissão
–afinal de contas, eu estava trabalhando. Mas quando o juiz apitou uma falta
para o Santos na entrada da grande área aos quarenta e cinco do segundo-tempo,
saí da sala e me posicionei de pé na porta de entrada, do lado de fora,
esperando o apito do juiz. E não deu outra: Mendonça bateu à meia-altura, no
canto, longe do alcance do goleiro adversário. Dois a um para nós, fim de papo
na Vila. Vibrei muito com aquela vitória e, assim que girei para baixo o
botãozinho preto e ouvi o “clic” indicando que o rádio estava desligado, cerrei
o punho com força e sussurrei,
agradecido: “valeu, pai!”.
São estas as pequenas memórias de que
somos feitos, e das quais dependemos para continuar vivendo e palmilhando cada
centímetro desta caminhada de sacrifícios, esperanças e alegrias chamada Vida.
Valeu, pai.
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